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A LINGUAGEM DO AMOR | Rubem Alves


"Examino os nossos currículos e os vejo cheios de lições sobre o poder. Leio-os novamente e encontro-os vazios de lições sobre o amor. E toda sociedade que sabe muito sobre o poder e pouco sobre o amor. E toda sociedade que sabe muito sobre o poder e pouco sobre o amor está destinada a ser possuída por demônios. É preciso reaprender a linguagem do amor, das coisas belas e das coisa boas, para que o corpo se levante e disponha a lutar. [...]

E é isto que eu desejo, que se instale na escola a linguagem do amor, para que as crianças redescubram a alegria de viver que nós mesmos já perdemos. CADA DIA UM FIM EM SI MESMO. Ela não está ali por causa do amanhã. Não está ali como elo na linha de montagem que transformará crianças em adultos úteis e produtivos. [...] Que a aprendizagem seja uma extensão progressiva do corpo, que vai crescendo, inchando, não apenas em seu poder de compreender e de conviver com a natureza, mas em sua capacidade para sentir o prazer, o prazer da contemplação da natureza, o fascínio perante os céus estrelados, a sensibilidade tátil ante as coisas que nos tocam, o prazer da fala, o prazer da história e das fantasias, o prazer da comida, da música, do fazer nada, do riso, da piada… Afinal de contas, não é para isto que vivemos, o puro prazer de estarmos VIVOS?
Meditação e Experimentação
Acham que tal proposta é irresponsável? Mas eu creio que só aprendemos aquelas coisas que nos dão prazer. Fala-se do fracasso absoluto da educação brasileira, os moços não aprendem coisa alguma… [...] A forma que tem a cabeça de preservar a sua saúde, quando o desagradável é despejado lá dentro, não deixa de ser um vômito: o esquecimento. A recusa em aprender é uma demonstração de inteligência. O fracasso da educação é, assim, uma evidência de saúde e um protesto: a comida está deteriorada, não está cheirando bem, o gosto está esquisito… [...]
E eu gostaria, então, que os nossos currículos fossem parecidos com a “Banda”, que faz todo mundo marchar sem mandar, simplesmente por falar as coisas do amor. Mas onde, nos nossos currículos, estão estas coisas de amor? Gostaria que eles se organizassem nas linhas do prazer: que falassem das coisas belas, que ensinassem física com as estrelas, pipas, os piões e as bolinhas de gude, a química com a culinária, a biologia com as hortas e os aquários, política com o jogo de xadrez, que houvesse a história cômica dos heróis, as crônicas dos erros dos cientistas, e que o prazer e suas técnicas fossem objeto de muita meditação e experimentação… Enquanto a sociedade feliz não chega, que haja pelo menos fragmentos de futuro em que a alegria é servida como sacramento, PARA QUE AS CRIANÇAS APRENDAM QUE O MUNDO PODE SER DIFERENTE: que a escola, ela mesma, seja um fragmento de futuro…
Para onde voam os Sonhos
[...] E eu gostaria, por fim que nas escolas se ensinasse o horror absoluto à violência e às armas de qualquer tipo. Quem sabe algum dia teremos uma Escola Superior de Paz, que se encarregará de falar sobre o horror das espadas e a beleza dos arados, a dor das lanças e o prazer das tesouras de podar. Que as crianças aprendessem também sobre a natureza que está sendo destruida pelo lucro, e as lições do dinossauro que foi destruído por causa do projeto de crescimento, enquanto que as lagartixas sobreviveram… [...] E que houvesse lugar para que elas soubessem das lágrimas e da fome e que o seu projeto de alegria incluísse a todos… Que houvesse COMPAIXÃO E ESPERANÇA…
E aqui está, minha filha, o meu bem dizer, minha bendição, meu melhor desejo: que você seja, com todas as crianças, da alegria sempre uma aprendiz, para citar o Chico, e que a escola seja este espaço onde se servem às nossas crianças os aperitivos do futuro, em direção ao qual os nossos corpos se inclinam e os nossos sonhos voam…" - Alves, livro Estórias de quem gosta de ensinar.

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